terça-feira, 23 de julho de 2013

44. Q de de Quintilha



Quintilha

Nos fins de tarde em que o Sol pinta os céus de amarelo e púrpura é como se toda a vida eu fosse impuro, quiçá ateu. Serão os efeitos cromáticos que me alteram a alma e que só tu sejas a fonte da minha adoração? Os Deuses do Céu que me perdoem mas fizeram-te mulher e a mim homem e puseram no céu o astro-rei. Tudo se conjugou mulher, homem, luz e as cores do dia quando cai. Se romântico fora, correria até à linha do horizonte com um grão de areia capaz de parar a engrenagem que faz mover os astros e pararia o Sol no pôr-do-dito. E faria de ti a minha silhueta, realçaria os teus seios a contraluz e empurrávamo-nos contra o chão húmido da praia. E rebolaríamos na areia e faríamos amor contemplando o céu. E as suas cores.


Longe o dia cai no horizonte
Brilham fortes cores mistas no céu
Me confesso impuro, quiçá ateu
Por só a ti amar, ó minha fonte
E no areal te possuir, amor meu.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

43. P de Palavras




Palavras ditas

Palavras. Palavras, mais palavras.
Ouço-as demagógicas, matracas
Ouço-as meigas, doces convites
Ouço-as ásperas que ferem
Ouço-as vãs, ouço-as ocas.
Palavras. Palavras que são só palavras.
Ouço-as suplicantes ou não as ouço,
Ouço-as desesperadas, clamantes
Ouço-as cantantes, harmoniosas, compassadas.
Ouço palavras que não são só palavras.
Ouço-as luxuriantes, palavras excitantes.
Ouço palavras que não parecem só palavras.
Ouço-as declamadas, teatrais
Ouço-os obscenas, ofensivas
Ouço palavras cuspidas, violentas.
Ouço-as lastimosas, chorosas
Ouço-as catitas, elogiosas.
Ouço palavras que se empancam e palavras que resvalam.
Ouço-as brilhantes, eloquentes
Ouço-as comedidas, parcas
Ouço-as retóricas, embrulhadas, trapalhonas
Ouço-as convincentes, com ordem e de ordem.
Ouço palavras que não o são.
Ouço-as titubeantes, gaguejadas, incompletas
Ouço-as medrosas, hesitantes e nervosas
Ouço-as repetidas, metralhadas
Ouço-as alegres, risonhas, contagiantes
Ouço-as contadas, acrescentadas, mentidas
Ouço-as falsas, intriguistas
Ouço-as curiosas, inquiridoras
Ouço-as sussurradas, secretas
Ouço-as rápidas, cursivas, intensas
Ouço-as lentas, pausadas, refletidas
Ouço-as sábias, filosóficas
Ouço as palavras que escrevo.


sábado, 13 de julho de 2013

42. O de Obscenidade



Obscena

Siderado me quedo
Da indiferença do teu olhar,
Quando apenas para ti me peralvilho.

Palejante se me aparenta a face
Da prostituída expressão
Com que me reprovas.

Eu, que por ti, me reverbero
Nem um telegráfico olhar
Te já mereço.

É por isso que hoje quebro
O sigilo a que me encomendei

E te denuncio, obscena.